sexta-feira, 30 de maio de 2008

IRAQUE ATERRORIZADO POR CINCO VEZES

Iraque, bombardeado por cinco vezes

Não é a primeira vez na sua história de sofrimentos que o Iraque foi bombardeado por forças colonialistas.
Na verdade, a chuva de bombas e mísseis que desabaram sobre a sua capital Bagdá, em 2003, marcou a quinta vez que tal desgraça lhe ocorreu.
O Iraque, então chamado de Mesopotâmia, foi ocupado pelos britânicos em 1918 e, devido a revolta árabe de 1920, foi ferozmente bombardeado na repressão que se seguiu.
Operação que voltou a repetir-se por ocasião da IIª Guerra Mundial, quando em 1941 os britânicos lançaram as suas tropas sobre o país para derrubar um governo nacionalista.
No transcorrer da Guerra do Golfo de 1991, Bagdá foi maciçamente atacada do ar e, a seguir, entre 1991 e 1998, a pretexto de proteger a Zona de Exclusão Aérea, seu território foi periodicamente atacado pela aviação anglo-americana até que ocorresse o desenlace da ocupação total do país.

O relatório da RAF

Esquadrilha de Snipes da RAF voando sobre o Iraque, 1920

"Agora eles sabem (os árabes e os curdos) o que é um verdadeiro bombardeio: eles sabem que em 45 minutos uma grande aldeia é praticamente varrida do mapa e um terço dos seus habitantes mortos ou feridos por apenas 4 ou 5 aviões que não lhes oferecem nenhuma possibilidade de serem abatidos, nem de combaterem gloriosamente, nem qualquer outra possibilidade material de escapar."Arthur Harris, chefe de esquadrão da RAF, Iraque, 1920

Winston Churchill, então secretário da Guerra Aérea, horrorizou-se quando leu o relatório que lhe enviaram do Iraque, em 1920.
Perturbou-o especialmente com a passagem que, em fria linguagem burocrática, narrava o bombardeio de um aldeia árabe onde as mulheres e crianças, apavoradas, tiveram que jogar-se num lago para escapar dos artefatos incendiários despejados pelos aviões da RAF (Royal Air Force).
“É um ato escandaloso”, exclamou ele.
O documento fora-lhe enviado por Arthur Harris, então um jovem comandante de esquadrão que fora transferido da Índia para a Mesopotâmia afim de aplacar a revolta iraquiana.
Harris era um entusiasta dos bombardeios pesados, e agiu no sentido de, além dos bombardeios Handley-Page, adaptar os aviões de transporte para que também pudessem carregar um maior número de bombas.
Defendia-se na ocasião uma nova tese estratégica, segundo a qual era possível, baseado na experiência da Iª Guerra Mundial, manter-se um pais inteiro, especialmente uma colônia, submissa somente pelo terror aéreo.
Naquela ocasião, o Império Britânico aquartelava na região uma guarnição de 25 mil soldados ingleses e 80 mil indianos, para garantirem o controle sobre as províncias de Mossul, Bagdá e Basca, num total de 105 mil soldados distribuídos por 51 batalhões.
Os estrategistas de Londres, com a ameaça dos aviões pairando nos ares sobre a cabeça dos iraquianos, queriam reduzi-los para dez mil soldados.
Quando estourou a revolta árabe na Mesopotâmia, em julho de 1920, em protesto contra o Mandato Britânico que retirava qualquer possibilidade do Iraque vir a ser independente, as autoridades inglesas decidiram agir implacavelmente.

Gás asfixiante e de mostarda

Se Churchill, num primeiro momento, mostrou-se melindrado com os efeitos dos bombardeios sobre a população civil árabe, ele não manifestou a mesma oposição em recorrer ao gás paralisante e mesmo ao gás de mostarda, ou JNB.
Num memorando enviado a sir Hugh Trenchard, major-general Chefe do Comando Aéreo, o pioneiro inglês da guerra aérea, solicitou-lhe que providenciasse “ some kind of asphyxianting bombs”, isto é, algum tipo de bombas asfixiantes, mas não mortais, para serem usadas nas operações preliminares contra “ tribos turbulentas”.

Conforme a resistência iraquiana se disseminou de Mossul, no norte, para as áreas dos xiitas, em Najaf e Karbala, no sul do Iraque, Churchill foi perdendo a compostura.
Numa reunião do gabinete, conta Simon Geoff (Iraq: From Sumer to Saddam, Londres, 1994) ele teria dito: “ Eu não entendo dessas desgraças provocadas pelo uso do gás. Sou inteiramente favorável ao uso do gás venenoso contra tribos incivilizadas(sic)”.

Arthur Harris (depois, na IIª Guerra Mundial, apelidado de “Carniceiro” Harris, famosos braço direito de Churchill) , então não se fez de rogado.
Os esquadrões de aviões Snipes e dos bombardeios Handley-Page 0/400 - fizeram a festa.
Um inferno de bombas de fósforos, foguetes, fogo líquido, bombas de estilhaçamento e de retardamento, desabou do céu sobre o que Churchill classificou de "tribos árabes recalcitrantes”, trazendo “ excelentes resultados de efeito moral". (*)

(*) Em fevereiro de 1920, a RAF havia feito uma primeira intervenção com bombardeios na Somália britânica para sufocar a rebelião autonomista do dervixe Mohammed bin Abdullah Hassan, apelidado de “Mad Mullah”, o mulá doido!, usando aviões modelo c/10 dH9 que compunham a Z force, que lançaram bombas e metralharam os somalis a vontade.

Não dar sossego aos árabes

Bombardeios britânicos em ação (tela de Carline)
Mesmo depois da grande revolta árabe-curda, que uniu sunitas e xiitas, ter sido sufocada em outubro de 1920 – levante que serviu como mito formador do Iraque moderno -.
A RAF , que promoveu 183.861 missões, lançando 97 toneladas de bombas sobre aqueles miseráveis, com um número mínimo de baixas (9 pilotos mortos e 7 feridos), continuou por um bom tempo ainda organizando sortidas aéreas de surpresa visando para atacar os lugares mais remotos possíveis da Mesopotâmia.

A orientação do comandante J.A.Chamier dizia que o melhor caminho para desmoralizar a resistência dos chefes árabes e curdos, entre eles o Xeque Mahmoud, era atacar e arrasar as aldeias, as mais remotas, das tribos mais importantes.
Não devia haver esmorecimento, martelar “com bombas e metralhadoras, dia após dia, as casas, seus moradores, as colheitas e o gado”.

Mostrar aquela gente “incivilizada” e arredia que o punho de ferro da Sua Majestade Britânica podia alcança-los onde eles estivessem, não lhes dando tréguas, impedindo-os que eles tivessem uma sensação de segurança, sequer de descanso.
Como disse o comandante Harris, “a única coisa que os árabes entendem é a mão pesada, e mais tarde ou mais cedo ela será aplicada”.
E assim, quando os beduínos no deserto levantavam suas preces a Alá, o que eles viam lá no alto não eram mensagens de bem-aventurança, mas o vôo dos mortíferos gaviões da RAF, rodando em circulo, barulhentos, com metralhadoras em riste, anunciando para eles a chegada da morte.

Operação britânicas no Iraque (1920):

Tropas e ocupação: 105 mil homens (25 mil ingleses e 80 mil indianos)
Aviação: esquadrões de caças e de bombardeiros: Snipes e Hardley-Page
Nº de horas de vôo: 4008 h.
Nº missões: 183.861
Baixas inglesas: 9 pilotos mortos e 7 feridos: 11 aviões destruídos
Vítimas iraquianas: de 6 9 mil mortos e feridos


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