VI UM SOFRIMENTO INIMAGINÁVEL EM GAZA
Na rubrica do Diário de Notícias, “Alegações finais”, de 3.03.2009, a jornalista Valentina Marcelino, entrevistou Francisco Corte-Real (1), especialista internacional em danos corporais, sobre a sua deslocação à Faixa de Gaza integrado numa equipa de peritos mundiais para averiguar da existência de alegados crimes contra a humanidade cometidos pelas forças israelitas, aqui se transcreve o seu testemunho.
Qual era o objectivo da deslocação a Gaza da equipa de peritos mundiais que integrou?
Averiguar, a pedido da Liga Árabe, se foram cometidos crimes de guerra e crimes contra a humanidade pelo exército israelita, durante os ataques que ocorreram entre 27 de Dezembro e 19 de Fevereiro.
Como foi constituída a equipa?
A Liga Árabe quis uma equipa o mais alargada possível. O "Independent Fact Finding Comittee" é constituído por seis elementos: eu próprio, como perito em danos corporais, um professor de Direito sul-africano, um juiz norueguês, um professor, jubilado, de Direito Internacional, holandês, e um advogado espanhol, especialista em Direitos Humanos.
Que suspeitas levavam?
Não nos deslocámos a Gaza com qualquer tipo de suspeita formada. Fomos de peito aberto, dispostos a ouvir todas as partes do conflito e a observar as condições no terreno.
O que viu em Gaza?
Uma destruição muito maior do que alguma vez pensara encontrar. Escolas, hospitais, casas destruídas. Ambulâncias queimadas. Muitas crianças feridas. Também mulheres. Vim muito chocado com o sofrimento dos civis. Um sofrimento de uma dimensão inimaginável. Realizei 10 exames periciais a crianças e mulheres, os quais podem ser utilizados no relatório que vamos entregar à Liga Árabe.
E qual foi a sua conclusão?
O relatório está a ser feito e será entregue até final do próximo mês de Abril.
Houve desproporcionalidade nos ataques de Israel?
O impacto dos ataques aéreos, marítimos e terrestres de Israel contra aquela população é de uma dimensão incomparavelmente maior do que o impacto dos rockets lançados contra Israel.
O cessar-fogo não facilitou a vida no território?
O bloqueio imposto por Israel ainda se mantém e impede a chegada de bens essenciais. Tem proporções absolutamente desumanas. Vivem ali cerca de um milhão e 500 mil pessoas, como se estivessem presas, numa extensão de terreno que não tem mais de 40 quilómetros de comprimento, por 45 de largura.
Israel garante que o Hamas utiliza civis e estruturas civis como escudo…
Não me quero pronunciar sobre isso.
Contactaram também Israel?
Enviámos duas cartas ao Governo de Israel a manifestar a nossa disponibilidade para ouvirmos a sua versão e esclarecer-nos sobre algumas questões. Aguardamos ainda a resposta.
(1) O Prof. Doutor Francisco Manuel Andrade Corte Real Gonçalves, é especialista em Medicina Legal, Prof. Associado da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra e Vogal do Conselho Directivo do Instituto Nacional de Medicina Legal.
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